Todo CIO experiente sabe que a modernização de sistemas legados não se resolve apenas com boas práticas de engenharia. As decisões envolvidas extrapolam o escopo técnico e tocam diretamente a estratégia, a cultura e os modelos operacionais da organização.

Em um cenário onde inovação e escalabilidade se tornaram imperativos de sobrevivência, a pergunta não é mais se modernizar, mas como.

Foi nesse contexto que o framework dos 6 R, Retain, Retire, Rehost, Replatform, Refactor e Rebuild, ganhou protagonismo. Mais do que uma taxonomia técnica, esses caminhos representam estratégias distintas de transição para o futuro digital. A maturidade com que cada organização interpreta e aplica esse modelo determina sua capacidade de sustentar inovação com estabilidade e segurança.

Na prática, os 6 R não são opções excludentes, mas componentes de uma matriz complexa de decisões. Alguns sistemas podem ser simplesmente retirados sem prejuízo ao negócio; outros, por sua natureza crítica ou valor histórico, exigem abordagens como refatoração ou reconstrução.

O desafio está em fazer essa leitura com precisão e timing e é aí que o papel da liderança de tecnologia se torna central.





Entre as alternativas do framework dos 6 R, há três abordagens que se destacam por sua complexidade técnica e impacto estratégico. São decisões que exigem mais da liderança de TI, tanto em análise quanto em execução, e que têm potencial de transformar profundamente a arquitetura digital das organizações. Entenda:



  • Replatform (Replataformar) representa um meio-termo estratégico. É o processo de migrar para uma nova plataforma, geralmente baseada em nuvem, com modificações mínimas no código. Seu valor está na relação custo-benefício: ganhos de desempenho, escalabilidade e integração com ecossistemas modernos, sem a complexidade de uma reescrita completa. Segundo Danilo Custódio, CEO da Mirante, “Replataformar bem é entender até onde se pode ir com a estrutura existente sem comprometer o que vem depois. Não é solução provisória, é base para evoluir com consistência.”


  • Refactor (Refatorar) é o próximo degrau de maturidade. Vai além da migração técnica: implica reestruturar partes do código para torná-las mais compatíveis com arquiteturas em nuvem, microsserviços, integrações por API e estratégias de entrega contínua. A lógica de negócio central é mantida, mas o sistema ganha novo fôlego. A refatoração exige conhecimento profundo do legado, visão arquitetural e governança disciplinada. Como reforça Custódio, “Refatorar é como fazer uma reforma com a casa habitada: exige planejamento, precisão e respeito ao valor do que já existe.”


  • Rebuild (Reconstruir), por sua vez, é a decisão mais radical — e a que demanda maior clareza estratégica. Aqui, o sistema é reescrito do zero, geralmente com base em novas tecnologias, paradigmas de arquitetura e lógica de negócio refinada. Trata-se de eliminar completamente o débito técnico acumulado, com máximo grau de otimização para nuvem, automação e inteligência. O esforço é alto, mas os ganhos em agilidade, governança e inovação compensam em ambientes onde o legado virou bloqueio estrutural. A Mirante tem explorado nesse campo a adoção de Sistemas Multiagentes, combinando agentes humanos, de IA e baseados em regras para orquestrar processos como análise, geração de código, validação e testes, com rastreabilidade e controle em cada etapa.




O que distingue essas abordagens bem-sucedidas é menos a escolha do “R” em si e mais a forma como ela é sustentada: por diagnóstico técnico rigoroso, visão de longo prazo e articulação entre tecnologia e negócio.

Um estudo recente da Gartner reforça esse ponto ao indicar que mais de 60% dos projetos de modernização falham não por razões técnicas, mas por desalinhamento entre as áreas envolvidas e ausência de governança clara sobre a transformação digital.

O uso do framework exige mais do que conhecimento: requer critério e contexto. Isso inclui reconhecer, por exemplo, quando uma aplicação crítica de backoffice, mantida em arquitetura monolítica, já não permite ganhos adicionais de integração com canais digitais, e precisa ser refatorada ou mesmo reconstruída para suportar a nova jornada omnichannel da organização. Nesse tipo de cenário, manter o legado não é conservar valor, é bloquear avanço.

Um erro comum é tentar resolver o legado como um problema isolado de tecnologia. Mas os dados mais recentes mostram que empresas que tratam a modernização como um programa transversal, com governança, capacitação e visão clara de arquitetura, colhem resultados mais consistentes.

A urgência não está apenas em reduzir custos, mas em criar uma base digital que sustente inovação contínua.